Já fui bancário, vocês sabem. Assim que completei 18 anos, precisava de uma graninha, e banco era o lugar ideal para se trabalhar. O expediente era só de tarde.
Além disso, o salário era bom porque ganhava-se, além do 13º, pelo menos mais dois salários de gratificação. Cheguei a receber cinco em um dezembro em que o banco teve lucro muito grande.
Quando fui promovido a escriturário, bem no início dos anos 1960, botaram-me no setor de contas correntes. Atendia o balcão.
Na época, cada cliente tinha uma grande ficha de cartolina. Depósitos e retiradas eram marcados a lápis.
Já o cara atrás de mim tinha as mesmas fichas. No entanto, o movimento era registrado numa máquina de escrever de dois rolos, sendo que tudo era impresso com um solvente especial para um livro.
No fim do dia, os registros dele tinham que bater com os meus e com uma rubrica chamada de Razão. Isso era controlado pelo caixa e checado pelo subgerente, o contador e mais adiante pelo balancete e depois no balanço auditado pela matriz em Porto Alegre.
Qualquer funcionário da agência, mas qualquer um mesmo, podia acessar as fichas sob meu controle. Então podia ver saldo, movimento mensal, saldo médio, essas coisas. Mesma coisa com o cara atrás de mim.
Não passava pela cabeça de ninguém xeretar a vida financeira dos ricos da cidade, Montenegro. Não era concebível que uma pessoa séria fizesse isso. Era pecado mortal. Muito menos para vender essa informação cadastral como começou a acontecer depois, em meados dos anos 1980.
O que quero dizer é que não é a facilidade de obter dados sigilosos que mudou as pessoas. Mas, sim, as pessoas é que mudaram. E para pior. Como podemos ver sem mesmo abrir um jornal ou ver noticiário de TV.