Há anos, conheci um morador de rua que se tornou um por opção. Era filho de fazendeira, que morava perto do meu prédio. E, simplesmente, desistiu. Sei lá por que cargas d’água. Pessoas de minhas relações conheciam a família do indigitado desistente, e ninguém conseguiu extrair algum motivo mais específico para deixar uma boa casa, dinheiro e uma vida boa.
Na marquise de um prédio vizinho, abrigavam-se um grupo de, eu ainda chamo assim, mendigos. Passavam as noites conversando e bebendo cachaça com refrigerante ou no bico mesmo.
Pois o filho da fazendeira, homem em torno de 45 anos, passou a frequentar a roda. Levava bebida boa, provavelmente fornecida pela mãe, e era o centro das atenções. Evidentemente, porque levava bebida e comida.
Como isso rolava de madrugada, nunca consegui chegar no grupo com olhos de olhar e ouvidos de ouvir. Pena, porque certamente rolavam papos interessantes ou esquisitos. Ou esquisitos porém interessantes.
Eu também sou o Homem da Lua. Tempos depois, o grupo sumiu, a mãe dele se mudou e eu nunca mais tive notícias dele.
Quando passo naquela calçada, lembro do caso, e penso nos que desistiram. Muitos deles, e eu observo essas coisas, sofrem do mal da lassidão. Preferem não trabalhar porque sempre rolam esmolas, comida e roupa velha.
Eu os vejo e sempre faço a mesma pergunta. Por que os catadores de lixo não desistiram? Por que os carroceiros não desistiram? Por acaso esses caras nadam em dinheiro?
Excetuando os que têm problemas mentais, em muitos casos, a desistência é muito maior que a força de vontade. Existem redenções e não são tão poucas assim. Então, não me acusem de ser desumano ou não ter pena deles. Foi a pena que os levou a esse ponto.