Você deve imaginar o calor que os Papais Noéis devem sentir usando aquelas roupas apropriadas para o Polo Norte e não para terras de luz e calor. Dentro de ambientes fechados com ar condicionado ainda vá lá. Entretanto, no passado, não havia essa moleza.
Quando tinha meus 20 anos, conheci um desses heróis, que gostava do cerimonial, detestava o calor gerado. Mas sempre tinha à mão um antídoto: uma garrafa de cachaça da marca Flor da Macega, cuidadosamente embrulhada em papel com estampas natalinas e guardada na lateral das botas, ideia de uma costureira que sabia do seu martírio.
Certa vez, perguntei para ele se a ingestão de álcool não piorava o calor, o que é óbvio. Não, disse ele, meneando a cabeça cheia de barba, sacudindo o rosto que levava o rabo do gorro para o outro lado.
– Tu ainda não sabe das coisas da vida. Presta atenção. A gente bebe no inverno para esquentar e bebe no verão para esfriar. No meu caso, como Papai Noel, ganho bebida de graça.
Como quem não quer nada, tirou a garrafa da lateral da bota direita, deu um longo gole e a tapou com cortiça surrupiada de uma garrafa de vinho barato. Como fiquei olhando, ele arrematou, enxugando a boca com as costas do fardamento.
– Tampinha é ruim, pode cair. Deus me livre de derramar canha!
Foi o único bom velhinho que ganhava presente em vez de dar.