“…nunca vi essa mulher com vestido curto, decotada, pintada, perfumada”
Anos 70, auge da invasão dos argentinos no Rio Grande do Sul. Fim de tarde. Um jornalista entra num táxi no ponto da Borges de Medeiros rumo à redação de Zero Hora. Duas hermanas de meia-idade disparam graçolas em cima dele assim que ele entra. – Mira, que guapo! O motorista ri. Baixa a bandeira e segue rumo à avenida Júlio de Castilhos. – Tá com tudo, meu irmão! Uma coroa tem lá seu valor, não tem? O jornalista não estava afim de papo. Mas o taxista, sim. Loquaz como apresentador de programa de auditório, desandou a falar. E começou a contar um caso. Mudou a cara de risonha para séria. – Esse negócio de coroa dando em cima da gente….fiquei pensando na minha sogra. Olha, cara, eu estou casado há 15 anos, moro com meus sogros e nunca vi essa mulher com um vestido curto, decotada, pintada, jóias, perfume, nada. Nem as unhas ela pinta, sabe? E pra feia não serve. Nunca olhou nem para o vizinho, o que dirá dar trela. Não vai a baile, reunião-dançante. Nem em festa da igreja ela vai, imagina. O táxi pára na primeira sinaleira. O trânsito está pesado. – Aí, meu chapa, no domingo passado aconteceu um negócio esquisito. De manhã cedo, ela saiu cedo dizendo que ia visitar uma amiga de infância. Quase caí de costas quando a vi: de vestido curto, floreado, pintada, perfumada… O carro entra na Júlio de Castilhos. Outro sinal fechado. (conclusão amanhã)