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Um profissional do desarme

“…conversavam animada e alegremente sobre viagens feitas e por fazer”

Fui a uma agência bancária quarta-feira, tirei a senha, sentei em uma das tantas cadeiras à disposição e esperei minha vez. Um rapaz de 20 e poucos anos, de boné, sentado duas filas adiante da minha vê um senhor de idade entrar. Cumprimenta-o efusivamente, eles falam em voz alta de coisas em comum, o senhor falou que ia pagar algumas contas. O rapaz se oferece para pagá-las. Uma velhinha sentada à minha frente abre o bocão.

– Mas o que é isso? Eu e outras pessoas esperando há horas para sermos atendidas e você se oferece para pagar as contas do seu amigo que chegou agora, isso é furar a fila! Mas que falta de respeito, seu moleque!

O idoso fica vermelho, tartamudeia algumas palavras que ninguém entendeu, depois ficou quieto. A velhinha seguia vociferando. Foi aí que eu vi o que é um profissional de desarme em ação. Durante todo o discurso da velha ele não alterou sua fisionomia e posição. Ficou olhando para ela, na diagonal. Entre uma respirada e outra, ele gentilmente pergunta que sotaque era aquele que ela tinha.

– Minha família é da Sicília, fique sabendo!

Ele arregala os olhos.

– Nossa, que bacana! Palermo, a senhora conhece Palermo?

A velhinha baixa a voz um pouco.

– Claro que conheço. Estivemos lá muitas vezes, por sinal…

O rapaz segue amaciando o bife.

– Eu acho a Itália tão bonita, a Sicília também. Não tenho recursos pra ir lá, mas gostaria muito.

Ela murmura alguma coisa, algo como “que pena, o senhor ia gostar muito”, por aí. Para encurtar o causo, em minutos os dois conversavam animada e alegremente sobre viagens feitas e por fazer. Chegou a vez dela ir aos caixas. Ao sair, despediu-se alegremente do rapaz, uma das maiores caras de pau que vi na minha vida.

– Tchauzinho, meu rapaz, cuide-se bem, fica com Deus.

Nem olharam para o outro velhote nesse meio tempo. Eu olhei. O rosto dele custou a desavermelhar, digamos assim.

 

Fernando Albrecht

Fernando Albrecht é jornalista e atua como editor da página 3 do Jornal do Comércio. Foi comentarista do Jornal Gente, da Rádio Band, editor da página 3 da Zero Hora, repórter policial, editor de economia, editor de Nacional, pauteiro, produtor do primeiro programa de agropecuária da televisão brasileira, o Campo e Lavoura, e do pioneiro no Sul de programa sobre o mercado acionário, o Pregão, na TV Gaúcha, além de incursões na área executiva e publicitário.

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