“…Já quebrou até o tabel e agora quer outro…”
Sento na cadeira do engraxate. Ele coloca aqueles protetores laterais entre as meias e o calçado, abre sua gaveta de graxas e tintas e começa a trabalhar. Encostada numa parede está uma mulher que estava a conversar com ele, interrompi o papo ao sentar na cadeira. Depois da escovada para tirar a poeira superficial, retoma a prosa.
– Eu não entendi essa compra. Como tem gente burra nesse mundo, tu não concorda?
A mulher concorda.
– Pois eu falei pra ela, como tu me compra um celu de 160 real que tem menos recurso que o de cem?
Ele começa a passar a pasta. Fiquei imaginando quem seria a burra, filha, irmã, tia. Ou a vizinha? Vejo que está fumando, joga fora a bituca e se volta para o amigo.
– E não se toca mesmo. Já quebrou até o tabel e agora quer outro. Não vou dar! Nem tenho recurso pra essa gastança.
A filha, então. Só pode. O engraxate faz tsk tsk tsk com a língua encostada entre o céu da boca e os dentes depois e fala.
– De cravar essa. Celular que nem aitubo tem…
Credo digo eu. Sapatos reluzentes vou para a roda do cafezinho. Encontro o fotógrafo Ricardo Stricher que me conta uma boa que viu e ouviu no bric da Redenção. Dois vendedores discutem e um deles trucida o outro.
– Tu é muito do chinelão, cara! Tu não tem nem carrinho de supermercado!
Como eu sempre digo para a gurizada, vivendo e aprendendo.